sábado, 12 de maio de 2007

Capítulo 2: matança!


O que são essas coisas voadoras parecidas com escorpiões de 117 micra de comprimento, que perfuram a carne, causando grandes bolhas negras e um rápido envenenamento sangüíneo por um período prolongado antes de resultar em uma agonizante e desordenada morte?

Os czarnianos também não sabiam.

E, como um dos efeitos colaterais era a quase paralisia total segundos após a infecção, eles não tiveram muitas oportunidades de descobrir. O que conseguiram foi muitos bilhões de pessoas inexplicavelmente doentes ao mesmo tempo. Em um planeta onde as doenças eram desconhecidas e 99,86% dos acidentes totalmente evitados, este não era um assunto engraçado.

Corpos inchados com ínguas negras exalando um odor rançoso de decomposição amontoavam-se nas ruas. Pais, mães e filhos rastejavam em cego desespero, unidos num grito de dor que se estendeu por todo o planeta, demorando cinco longos dias antes de se extinguir... no silencio gélido e doentio da abominável morte.

E enquanto um planeta morria, seu assassino sorria.

Em uma sacada ornada entre as elevadas torres de Czarnia, o satânico Lobo relaxava. Um copo de neurovinho espumante umedecia lábios ressecados por uma obscena expectativa. Ele passava sua outra mão pelos cabelos – um rápido e gracioso movimento que gastou muitos meses aperfeiçoando. No brilho acetinado da parede, ele avistou seu reflexo, riu e suspirou afetadamente com a visão. Ele se achava definitivamente o máximo!

Sim, senhor! Ele veio de uma longa caminhada desde aqueles dias precoces e cambaleantes, quando era um grande negocio cremar todo babaca que cruzasse seu caminho ou quando suas aspirações se resumiam a assassinatos simples e insalubres. Na escola, a violência quase o entediou, mesmo em seus piores extremos. Ele detestava todos que encontrava, e os tratava de acordo. Todo o planeta Czarnia conhecia e temia o seu nome.

Nenhuma solução quanto a existência e Lobo foi encontrada. As súplicas ao seu lado benevolente não surtiram efeito, pois ele próprio declarou desconhecer o que era “piedade”. O uso da ameaça, totalmente estranha aos costumes czarnianos, foi logo considerado, mas logo abandonado quando perceberam que ninguém saberia ou teria coragem para fazê-lo.

E, quanto mais Lobo piorava, mais Lobo gostava...

Até agora, no final de sua adolescência, seu ego monstruosamente inflado deu o passo derradeiro. Empregando uma inteligência que, em diferentes circunstancias, teria feito dele o maior neurocirurgião do Universo de todos os tempos, Lobo pôs mãos à obra na aula de Biologia.

Ele veio com umas coisas voadoras parecidas com escorpiões de 117 micra de comprimento, que perfuram a carne. Se alguma testemunha tivesse sobrevivido, ela nos contaria sobre a risada assustadora que cortou o ar enquanto ele quebrava os desprezíveis frascos da morte. A gargalhada fluiu com o vento e muitas das vítimas poderiam jurar que, mesmo sentindo as picadas dos milhões de insetos em seus corpos, o eco daquela risada profana os amedrontava mais... se alguma testemunha tivesse sobrevivido.

Em sua sacada, Lobo, o Senhor da Morte, ergueu seu copo em um brinde final. Um estranho êxtase percorreu sua espinha. Complexas reações químicas em seu cérebro o levaram a um estado de mística euforia. Por um momento, ele se lembrou de Daline Zaand, seu primeiro amor, de suaves curvas e hálito doce e morno. Um fogo brando percorreu seu sangue. Um gemido baixo irrompeu de suas entranhas, deixando rijo cada músculo de seu corpo.

Matar um planeta era como Daline Zaand... só que bilhões de vezes melhor.

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