segunda-feira, 31 de dezembro de 2007

Viagem a Darjeeling

Há algo que distancia os filmes do diretor Wes Anderson dos de outros cineastas; uma espécie de meditação romântica sobre as desagradáveis, mas inevitáveis e necessárias, experiências de amadurecimento (que, no fundo, são o que proporciona um senso de perspectiva e conforto mais tarde na vida). É a mesma sensação que tive, por exemplo, quando li “O apanhador no campo de centeio”, do Salinger.

Enquanto a maioria dos cineastas realiza filmes com uma ou duas cenas memoráveis, alguns diretores, como Anderson, parecem querer que cada cena seja um grande momento – uma combinação perfeita de música, imagem e atuação que encapsula uma certa emoção ou estado de ser.

Em "Viagem a Darjeeling" (The Darjeeling Limited), três irmãos embarcam numa viagem de trem pela Índia. Eles não se falavam desde o funeral do pai e cada um deles traz consigo um problema: Francis é suicida; Peter está com problemas no casamento; e Jack está se recuperando de uma desilusão amorosa. Ao longo da jornada, eles brigam, são expulsos do trem, procuram pela mãe, que os abandonou, e tentam encontrar purificação espiritual. Ao final do filme fica a sensação de que a verdadeira viagem era para aprender a apreciar os prazeres simples que vêm quando se deixa a vida acontecer, assim como no livro do Salinger.

O filme é sobre estar consciente dos perigos de ceder aos mais íntimos impulsos, de que mesmo num ambiente cuidadosamente construído as coisas podem desmoronar e, mais que isso, de que no fundo todas as certezas que se tem não passam de ilusão. O filme consegue transmitir um sentimento de família, não sei se no sentido estrito, mas na forma como seus membros possam interagir, o modo distinto de como as pessoas demonstram amor e preocupação e o desejo de manter essas conexões.

Em determinado ponto da narrativa, o trem em que as personagens estão se perde. A idéia de um trem que se perde dos trilhos é uma boa metáfora para a situação da família Whitman. Francis, o irmão mais velho, cujo rosto foi destruido numa tentativa de suicídio, se pergunta em que ponto da vida seu caminho e o de seus irmãos se distanciaram (uma vez que partiram dos mesmos trilhos...) e se algum dia eles seguirão na mesma direção.

O modo como Anderson filma as seqüências, permite que algumas cenas corram sem edição e que os três irmãos sejam enquadrados num mesmo quadro. A imagem reflete o espaço claustrofóbico do trem, mas também força os irmãos a ficaram próximos uns dos outros.

O filme tem uma bela fotografia e muito do humor vem do modo como as personagens interagem com o local exótico. Assim como nos outros filmes do diretor, a trilha sonora é composta por uma seleção bastante eclética, com músicas do The Kinks, Rolling Stones, Joe Dassin, Peter Sarstedt e várias faixas retiradas de filmes indianos. Fechando para balanço, na minha opinião, é o melhor filme de 2007.


sábado, 8 de dezembro de 2007

Clatu, verata, nictu?

As vezes me perguntam de onde tirei o nome desse blog. Como a explicação foi dada apenas no início dos tempos, no longíquo ano de 2004, e tendo em vista que com o advento do Youtube os argumentos agora podem ser ratificados com som e imagem, acho que está na hora de desvendar o segredo.



"Clatu, verata, nictu" (ou ainda, "Klatu, ferata, nictu", ou, como é mais próximo do original, "Klaatu, barada, nikto") é uma expressão que surgiu no filme de ficção cientítica da Guerra fria, "O dia em que a Terra parou" (The day the Earth stood still, 1951). A frase era usada para impedir que um robô, chamado Gort, destruísse a Terra: "Gort! Clatu, verata, nictu!".

Embora algumas pessoas acreditem que é uma expressão em latim, na verdade trata-se apenas de uma idiossincrasia. Tanto é assim, que não há uma tradução coerente, ao menos não que eu conheça.

"Clatu" é o nome do alienígena humanóide do filme. Em russo, a palavra "barada" (escrita "borodá"/"борода", mas pronunciada "baradá") significa barba e "nikto" (никто) significa "ninguém". Em resumo, fora do contexto do filme não quer dizer nada. Apesar disso, ao longo do tempo a expressão foi usada repetidamente na cultura popular.

Os membros da banda Creedence Clearwater Revival eram fãs do filme e durante sua turnê de 1969 inscreveram as palavras "Klaatu barada nikkto" em todos os seus equipamentos e intrumentos. O robô Gort faz uma minúscula aparição na capa do último álbum em estúdio deles (Mardi Gras).


No filme "Encontros imediatos do terceiro grau" (Close Encounters of the Third Kind, 1977) há uma tomada aérea de uma área subdividida em escritórios com várias pessoas tentando contactar alienígenas. Numa das paredes a frase aparece escrita num grande banner numa das paredes.

No filme "O retorno de Jedi", dois dos guardas de Jabba são chamados Klaatu (um membro da raça nikto) e Barada (um alienigena da espécie Klatooniana).


Por último, mas mais importante, no filme Noite alucinante 3 - O exército das trevas (Evil dead 3 - Army of darkness), o protagonista, Ash, precisa recitar a frase "Clatu, verata, nictu" para afastar o mal e recuperar o Necronomicon, o livro dos mortos. O herói, em sua infinita ignorância, se esquece das palavras e balburcia algo como "Clatu, verata... necktie?" e assim desperta uma horda de zumbis malígnos.





Aí, você me pergunta novamente, "e o que é que isso tem a ver isso com o porquê do título desse blog?" e mais uma vez e eu lhe repondo: nada! Na falta de um título melhor resolvi puxar pela memória e recitar as palavras esquecidas num dos meus filmes preferidos, talvez como uma forma de evitar que um exército de zumbis começase seu domínio da internet por este humilde diário eletrônico.

À espera dos bárbaros

Constantino Kaváfis (1863-1933)  O que esperamos na ágora reunidos?  É que os bárbaros chegam hoje.  Por que tanta apatia no senado?  Os s...